Blog Clipping
segunda-feira, junho 30, 2003
 
Fonte: DNA - Diário de Notícias de 28 de Junho de 2003

NOTÍCIAS DA BLOGOSFERA
José Mário Silva
DNA, 28/06/2003

Há cerca de seis meses, precisamente no primeiro dia do ano, eu criei um blogue com o meu irmão. Na altura, contavam-se pelos dedos as pessoas que sabiam o que isso era. Um blogue. Hoje, provavelmente, contam-se pelos dedos as pessoas que não sabem. Em pouco tempo, a blogosfera (como é comum chamar-se ao universo dos blogues) passou de uma espécie de clandestinidade obscura para a mais iluminada das ribaltas, sem meio termo, à semelhança de tantas outras coisas em Portugal. Se de início houve uma desconfiança porventura excessiva dos media tradicionais em relação ao fenómeno, agora acontece precisamente o contrário. Estamos em plena blogomania: os jornais de referência citam os blogues e dedicam-lhes editoriais; há destaques, reportagens e perfis de «bloggers» a aparecer por todo o lado; entrevistas em programas de rádio; o diabo a sete. De repente, ter um blogue ficou «in», é giro, é moderno, confere estatuto, «está a dar». Toda a gente opina sobre a questão, mesmo quem visivelmente desconhece os meandros da blogosfera. E as polémicas sucedem-se, dos blogues contra os jornais e também, desde a semana passada, dos jornais contra os blogues (veja-se a última crónica de Pedro Rolo Duarte neste suplemento).
O clima, convenhamos, é de alguma efervescência, para não dizer histeria. E talvez seja altura de fazer um primeiro balanço, começando por constatar que o número de blogues portugueses continua a crescer de forma quase exponencial. Se no princípio do ano, quando escrevi nesta mesma página uma crónica didáctica sobre o assunto, existiam pouco mais de 100, agora já ultrapassam os 700 (conferir em http://blogsempt.blogspot.com/ e http://blogo.no.sapo.pt/), havendo quem preveja para as próximas semanas a entrada na casa dos milhares. A esta explosão quantitativa correspondeu também, como seria de esperar, uma especialização qualitativa. Se de início predominavam os blogues pessoais (diários íntimos), seguiu-se uma vaga de blogues de reflexão essencialmente política e cultural, para desembocarmos agora num leque quase ilimitado de tendências. Há, literalmente, blogues para todos os gostos: humorísticos, regionalistas, bibliófilos, de arquitectura, futebolísticos, eróticos, religiosos, gastronómicos, apócrifos, académicos, literários, rascas, eruditos, «you name it». Alguns são excelentes (sendo que a palavra «alguns» equivale, neste universo, a umas boas dezenas), outros são apenas razoáveis e muitos não têm qualquer interesse. A blogosfera, no fundo, limita-se a reflectir o que acontece em qualquer outra actividade humana. É a velha história da curva de Gauss: impera a mediania, rareia a excelência. Como em tudo. Sejamos honestos: ninguém deixa de ouvir os cantores de qualidade só porque sabe que existem os pimbas, pois não?
Uma coisa é certa: a blogosfera, com todas as suas potencialidades e limitações, veio para ficar. Talvez ainda não justifique tanta exposição mediática (sobretudo se tivermos em conta que os blogues mais frequentados registam uma média de apenas 500 visitas diárias), mas a verdade é que está a nascer ali qualquer coisa radicalmente nova, entusiasmante, criativa, paradoxal, livre e (talvez por isso) muitíssimo bela. Essa «coisa» nova, ainda em construção, ainda a emergir do magma mais ou menos caótico de centenas de vozes que se sobrepõem e contradizem, essa «coisa» nova é preciosa. Quem não perceber isto, não percebeu nada.
Devemos então glorificar acriticamente a blogosfera, como se fosse o El Dorado redentor da mediocridade geral? É claro que não. Mas devemos discuti-la com seriedade, porque é de um fenómeno sério que se trata. Pela primeira vez, a internet perfila-se como um complemento válido à imprensa clássica. Falo de complemento, sublinhe-se; não de alternativa. Ao contrário do que muita gente insinua, a blogosfera não é um «lugar» (se é que podemos falar de «lugar» na imaterialidade do ciberespaço) onde se faça jornalismo, pelo menos nos moldes tradicionais. A blogosfera é outra coisa. Umas vezes segue os temas e o «modus operandi» do jornalismo (nomeadamente nas críticas a acontecimentos culturais ou no comentário político), mas na maior parte dos casos não. Nos blogues, as notícias e as crónicas cruzam-se com apontamentos do quotidiano, divagações filosóficas, «private jokes», poemas, gestos de amizade, desabafos e toda a sorte de pequenas referências que nunca teriam lugar num jornal, embora se enquadrem perfeitamente no espírito heterodoxo e multiforme desta nova forma de comunicar. A blogosfera não é a continuação do jornalismo por outros meios (ou sequer por outro meio). A blogosfera é o que é, passe a tautologia. Ou melhor, é o que ainda não é. É o que há-de ser.
Separadas as águas entre a blogosfera e o jornalismo (por muito que aparentem ser, nos tempos que correm, irmãos siameses), levanta-se uma magna questão: devem os jornalistas profissionais escrever nos blogues? Para o director deste suplemento, a resposta só pode ser negativa porque «quando os profissionais do jornalismo se envolvem em “blogues”, estão a negar a essência do seu trabalho e a viciar o jogo da liberdade», além de embarcarem em exercícios «de vaidade pura» e de «presunção sem pai nem mãe». Depois de muito pensar sobre o assunto, e de reler os blogues escritos por jornalistas (Francisco José Viegas foi uma das últimas «aquisições»), continuo sem perceber em que medida há naqueles textos, geralmente mais espontâneos e sem as limitações editoriais que nascem do facto da imprensa ser «finita no espaço e no tempo», qualquer negação da «essência» do jornalismo. O que se passa, muito simplesmente, é que alguns jornalistas não se esgotam na sua crónica semanal e têm, na internet, um meio de publicarem tudo aquilo que lhes interessa escrever, mas que não cabe (por razões de tamanho ou temática) na lógica própria da imprensa. Será isto «viciar o jogo da liberdade»? Porquê? Como? O jogo da liberdade ficará viciado, isso sim, no dia em que se decretem quaisquer limitações no acesso à blogosfera. Quem é que estabeleceria o «numerus clausus»? E com que critérios? Na realidade, nada disto faz sentido, porque a blogosfera é virtualmente infinita. Ninguém «ocupa» o lugar de ninguém. Há espaço para toda a gente, até para os que assumidamente não gostam de blogues (esses podem escrever sobre a sua aversão, por exemplo). No limite, chegado o dia em que todos os portugueses tenham acesso à internet e saibam escrever duas frases seguidas, cada habitante deste país pode manter o seu blogue. Mas isso, claro está, é entrar no domínio das distopias.
Quanto à vaidade e presunção, o que se passa é precisamente o inverso. Entrar na blogosfera, onde não existem hierarquias e todos os «bloggers» estão em pé de igualdade, exige coragem e humildade. Coragem porque não é fácil sobreviver num meio em que as polémicas são permanentes e agressivas, a troca de argumentos exige boa preparação teórica e o nível médio da escrita é francamente elevado (já para não para falar do escrutínio apertadíssimo feito pelos leitores, nas áreas de comentário). Humildade porque nos apercebemos todos os dias que há pessoas, nomeadamente as que não têm acesso aos jornais, que sabem mais do que nós, são mais cultas do que nós, estão mais bem informadas do que nós e escrevem melhor do que nós. De resto, essa foi uma das principais lições que aprendi nestes seis meses de blogosfera, juntamente com a constatação de uma inesperada generosidade «inter pares». Mas isso já seria matéria para outra crónica.
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Fonte: www.pauloquerido.com

(Versão sem cortes da entrevista publicada no Expresso, revista Única, Sábado, 28 de Junho de 2003)
Texto de Paulo Querido

"O Pipi é o camionista que há dentro de cada um de nós"

No universo de perto de um milhar de blogs escritos por portugueses, há um que se destaca. Intitula-se O Meu Pipi e contém textos com tanto de palavrões e ideias menos elegantes como de humor de fino recorte. Num mês apenas tornou-se numa referência transversal da blogosfera nacional, sendo mencionado tanto nos blogs mais "sérios", da política aos temas sociais, como nos blogs marcadamente pessoais. Entrou já nos hábitos de leitura de muitos internautas, que começam o dia por ler os jornais do costume -- e O Meu Pipi, cujos textos discutem depois ao almoço, rivalizando com as temáticas do futebol e da actual confusão nacional entre política e tribunais. O fenómeno é de tal ordem que atraiu o interesse de editores dispostos a passar a livro as entradas diárias publicadas em www.omeupipi.blogspot.com. Depois do contacto por correio electrónico o EXPRESSO entrevistou, pessoalmente, o autor do blog. Cuja identidade -- a pedido do próprio -- permanece oculta.


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EXPRESSO: Que razões o levaram a criar este blog?
PIPI: Contar coisas. O Meu Pipi é uma faceta minha. Que um gajo tem dificuldade em exibir socialmente. Não é uma faceta que faça sucesso no salão. Mas está cá dentro. Suponho que há uma consciência javarda, comum ao sexo masculino. Todos nós temos dentro de nós um camionista, um mecânico, o gajo que cola na parede do escritório o calendário de gajas nuas. Embora não se possa mostrar na vida social, este nosso lado está presente: Apesar de não os podermos revelar, quantas vezes temos estes pensamentos, sobre estas teorias, e quando está a foder fez -- ou faria -- isto e aquilo, e não fica orgulhoso ou se sorri...

Mas pode dizer em certos círculos de amigos, à mesa do café... porquê num blog, um sítio público onde pode ser lido por qualquer pessoa?
Mesmo com os amigos não se pode dizer tudo. "Pá, ó Pipi, que é que é essa merda que tás a dizer para aí? És um gajo doente!". O que nos leva à parte saudável do blog, que é poder canalizar essa faceta e até levá-la ao extremo: na Internet não temos constrangimentos nenhuns, é só mandar a merda cá para fora. Evidentemente, depois há uma componente humorística e outra de tentar chocar o leitor, de vez em quando, de uma forma galhofeira. Como quando escrevi sobre a punheta de mamas: os nossos amigos são capazes de nos contar de um broche ou de uma foda que deram, mas nunca ouvimos um amigo -- e muito menos o nosso pai -- dizer-nos, "que bela punheta de mamas fulana me fez". É algo que está no imaginário mas nunca se fala.

Falou aí no humor e na provocação. Percebe-se rapidamente que O Meu Pipi tem um bom nível de escrita, até de erudição, com um Português correcto - sendo aliás isso que o distingue de outros blogs do género e, talvez, a razão de ter sucesso e os outros não. Que treino, que formação, tem o autor?
Tenho formação específica na arte de bem escrever -- e sobretudo javardice, está bem! (risos). Não, a verdade é que disponho de uma ferramenta informática nova, de que poucos ouviram falar, que é um corrector ortográfico de javardice, o Filip4: quando escrevo "piça" ele apresenta as alternativas "nabo", "marsápio" e "madeiro" (risos) Agora a sério: o Pipi frequenta o curso de Comunicação Social e escreve relativamente bem porque tenta ignorar o que os professores lhe transmitem nas aulas... o que é fácil, porque ele só as frequenta por causa das gajas. Sobretudo no Verão!

Isso explica aquela entrada sobre os perigos das gajas boas? (em www.omeupipi.blogspot.com/2003_05_25_omeupipi_archive.html)
Sim. Tudo o que escrevo tem um fundo de verdade. Não me lembro se ocorreu numa aula, mas é verdade que, quando estou na cama e tal, e preciso de retardar o meu orgasmo, tenho esse truque de começar a pensar: "ora bem, Moreira na baliza, Quarteto defensivo com Miguel, Argel, Hélder e Ricardo Rocha..." Ou penso na Manuela Ferreira Leite, ou assim. E não sou o único homem que recorre a esse expediente. Mas quero voltar um pouco atrás na conversa. Há uma vertente interessante na autoria do blog. Para aproveitar o potencial humorístico de um texto é necessário que este seja bem escrito. Palavrões à balda, qualquer um diz na taberna. Tomemos como exemplo a entrada da leitaça: é um ensaio, pá! Distingue as origens, os usos e a pragmática. Aplicar um discurso tipo ensaístico a uma coisa como a leitaça, ou a punheta, é um recurso humorístico. Eu podia usar o mesmo discurso, a mesma chapa, a outro assunto, como o futebol. E os leitores aí não se chocariam nem ririam. Agora, um leitor lê esse comentário da leitaça e não pode deixar de pensar: "houve um maduro que perdeu tempo da sua vida a filosofar sobre a leitaça e a escrever sobre tal temática um texto com cabeça, tronco e membros!"

Confirma-se portanto o que já corria, que o autor de O Meu Pipi é estudante universitário... Só se enganaram na faculdade...
Certo... Já que tenho de falar sobre o Pipi, aqui vai: é um gajo que lê, lê bastante, lê tudo, livros e revistas. Leu o Luiz Pacheco. Leu o Sade, porém ficou desiludido: não percebe porque é que o Marquês estava a ir tão bem e depois cortou-se.

O que anda a ler agora?

Os livros da Margarida Rebelo Pinto mas é por causa da fotografia da contra-capa (risos). De resto, foi à Feira do Livro -- para ver as gajas (risos). Bem, mas atenção, o Pipi lê e gosta, mas acha que indicar livros aos outros é muito roto...

Já se percebeu que quando partiu para o O Meu Pipi foi pela descarga que o blog permite. Mas tinha outro objectivo, pensou alguma vez no sucesso que o blog veio a ter?
Para ser sincero, esperava mais. Fiquei um bocado desiludido, só agora, passados quase dois meses [a primeira entrada do blog é de 8 de Maio, n.d.r], é que surgem os convites, a primeira entrevista no EXPRESSO... Agora a sério: pensava que as pessoas se iriam indignar e protestar, mas nunca que fosse o sucesso relativo que é neste momento. Esta entrevista e outros pedidos, mais uma proposta que recebi para editar um livro... O projecto foi muito além das expectativas. É uma surpresa. Mesmo sabendo-se, e eu sei, que a Internet é um ímane de porcaria, de javardice, de sexo e pornografia...

...a escrita do Pipi pode ser considerada pornográfica?
Claro. E mesmo por isso, o que mais me impressiona é que na rede há uma escolha imensa de filmes, fotografias, textos -- o que uma pessoa quiser, enquanto O Meu Pipi são letras, texto: como é que pode concorrer, em termos da atenção do público, com esses sites?

E já tinha concorrência propriamente dita, blogs com linguagem de "mau gosto" ou de temática semelhante. Mas tornou-se maior que todos eles.
Bem, no princípio recorri a um artifício para ganhar alguma visibilidade: os insultos. Meti-me com os autores do Complot, que afirmei serem todos uns rotos, eles ficaram indignadíssimos. Meti-me com a Coluna Infame, com o Cruzes Canhoto, o Gato Fedorento... Nesse tempo o blog até podia ter ido por um sentido diferente. Mas era estúpido: passado um tempo eles deixavam de me ligar e o blog cairia no esquecimento. Foi giro para espicaçar, no entanto o objectivo do blog não era o insulto. Acabei por colocar uma entrada a pôr ponto final nisso, dizendo que tinha chamado paneleiros a toda a gente mas que considerava que qualquer um que fizesse um blog -- eu incluído -- era roto. Serviu para apaziguar e voltar ao trilho inicial. Mas na verdade nem sequer nutro especial interesse pelos blogs de palavrões gratuitos.

Mas é aí que O Meu Pipi marca uma diferença: nos seus textos o palavrão não é gratuito, ou pelo menos não surge como tal ao leitor. As suas entradas possuem, além da língua portuguesa sem erros, um substrato que os outros não apresentam. Só encontro esta explicação para o sucesso -- sobretudo o sucesso entre a blogosfera portuguesa do presente, mediática, que é constituída pelos blogs políticos. Até esses mencionam e elogiam O Meu Pipi. Tornou-se numa referência, da extinta Coluna Infame ao site do Miguel Esteves Cardoso, passando pelo Blog de Esquerda.

Exactamente. A menção do Miguel Esteves Cardoso (MEC) foi uma surpresa. O Pipi tem uma admiração pelo MEC, na minha, perdão, na opinião do Pipi não há actualmente nenhum escritor de humor em Portugal ao nível dele. Desde logo, por a certa altura terem confundido o Pipi com o MEC. Pessoas como o José Mário Silva e o Pedro Mexia [dois dos jornalistas blogueiros mais conhecidos, n.d.r.] chegaram a acreditar nisso. É lisonjeiro, claro. Mas é bizarro. Depois, o próprio MEC classificou O Meu Pipi de "genial", na página dele [www.pastilhas.com, n.d.r.]. E finalmente, colocou um comentário n'O Meu Pipi a confirmar que não era ele. Quanto a ter-se tornado numa referência... não esperava, claro. Esperava, sim, passado um mês começar a perder leitores e menções. Já lá vão quase dois meses... E continuo a ter ideias parvas para manter o projecto por mais tempo.

Algumas são impublicáveis?

Bem, algumas. Se voltasse atrás, não escreveria algumas. Uma história que escrevi a propósito do miúdo iraquiano que ficou sem braços, hoje provavelmente não a publicaria.

Mas esse texto fugia ao tom marialva, machista até, que caracteriza O Meu Pipi e o torna fresco, uma novidade num mundo dominado pelo politicamente correcto.
Quando diz "marialva", no sentido do machismo, da separação entre homens e mulheres talvez. Mas a palavra está associada ao forcado ribatejano e conheço muitos que são cretinos e uns ciumentos, que casam com a mulher mais feia com medo de serem encornados.

Voltando ao sucesso do blog: como reage? Aumenta a responsabilidade? Faz pensar duas vezes antes de editar de novo?

(Pensativo) Isto acastelou-se de uma maneira... É a tal coisa: tenho insistido na surpresa e é isso que continuarei a tentar fazer. O Pipi continua humilde (risos). É surpreendente ser tão referenciado na blogosfera e tão lido na Internet. Isto é só um blog! É como uma conversa de balneário, onde estão gajos nús de gravata -- a gravata representa o facto de ser bem escrito -- a conversar sobre gajas. Tem graça, nunca tinha feito esta associação de ideias, mas é bem fiel: eu joguei râguebi em Coimbra e nos balneários tínhamos conversas até mais javardas que O Meu Pipi. Quanto à responsabilidade, quero espetar a agulha no balão de ar: pensar em elevar o nível, ora o nível é a parvoíce! A verdade é que tenho ciúmes do Pipi: tenho outro blog, farto-me de publicar lá textos que acho muito bons e não tenho o mesmo tipo de reconhecimento. Aliás, é nele que publico os meus textos mais elaborados -- o que contribui até para não sentir pressão nenhuma quanto a'O Meu Pipi. Se este correr mal, corre.

O que sente então ao escrever para O Meu Pipi?
É uma mistura de alívio com alegria. Há uma volúpia, até, em teorizar sobre caralhadas! Quando escrevo um texto para o outro blog tenho cuidado, releio, dou-lhe importância, enquanto para O Meu Pipi é diferente: em geral parto de uma ideia prévia, mas aquilo vai saindo, umas teorias atrás das outras! E há teorias que, se um gajo for a ler bem, não fazem sentido nenhum mas quando as pessoas estão a ler dizem, "isto faz sentido". É uma questão de forma, os textos têm uma coerência interna, funcional, embora descrevam ideias absurdas ou mesmo disparates completos -- como aquela da diferença entre o rabo de um homem e o de uma mulher. Agora, atenção: eu cuido os textos do Pipi, tento não repetir termos, rebusco sinónimos, se aqui não fica bem "nabo" troco por "madeiro", ou outro termo...

Os leitores esperam isso?
Claro! O factor novidade fá-los voltar.

E agora? Que vai acontecer a'O Meu Pipi?
"Pipi: the movie", "Pipi: o talk-show" (risos). Quero continuar a levar a alegria a milhares de portugueses e brasileiros. E quero outra coisa: quero manter o mistério sobre a identidade do Pipi. Aliás, um amigo teve uma excelente ideia quando lhe contei que fora convidado a publicar um livro: colocar um apresentador de televisão a ler passagens do livro no lançamento, alguem como o Rui Unas e o autor, claro, não dava a cara -- mas eu estaria lá ao lado de outros convidados. O Pipi faz suas as palavras de José Saramago: "tudo o que há-de ser meu, às mãos me há-de vir ter".
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quarta-feira, junho 25, 2003
 
Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

A Nova Ágora da Democracia, Ou Quando a Política Chega À blogosfera
Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

No Brasil, a blogosfera conta com mais de três mil blogues. Em Portugal, existem perto de mil. Mas a erupção do fenómeno, nascido no ano passado, parece estar agora a revelar-se e ilustra-se com a apresentação diária de dezenas de blogues. Basta observar a lista disponível em blogsempt.blogspot.com, à qual já aderiram, entre outros, Francisco José Viegas (aviz.blogspot.com), Jorge Ferreira (22blog.com/jf2003/), Miguel Vale de Almeida (valedealmeida.blogspot.com) e Nelson de Matos (textosdecontracapa.blogspot.com). Para meados de Julho, e depois de José Pacheco Pereira (ver caixa), é a vez do deputado socialista José Magalhães entrar na blogosfera com um prolongamento do seu Ciberscópio, publicado no jornal "A Capital".

Muitos dos blogues nacionais são meramente acessórios, adoptando registos diarísticos, que, aparentemente, só interessam a quem os produz. Outros, são tidos como uma espécie de serviço público: a eles afluem um elevado e diversificado número de leitores; neles se podem ler comentários, opiniões e textos de divulgação que abrangem desde a política à literatura, passando pela educação e ideias, até às artes e ao humor. Neste contexto, existem blogues temáticos, que cingem os seus escritos, por exemplo, ao jornalismo, e blogues que mesclam propostas. Entre estes últimos, encontram-se algumas das páginas mais interessantes da blogosfera. E é significativo que sejam vincadamente politizados.

No rol de blogues políticos - e aqui não se incluem aqueles que pecam pelo puro "exibicionismo político", como foi aludido no Desejo Casar - a fronteira faz-se entre a direita conservadora e a esquerda distante do centro. Que edificaram um muro ideológico naquela que foi a fase mais politizada na blogosfera: durante a guerra no Iraque. Assunto que, além de ter incrementado uma clara clivagem de posições, desencadeou a discussão de muitos outros temas e acontecimentos políticos.

Em termos exclusivamente quantitativos, é longa a distância que separa a direita e a esquerda: os esquerdistas estão representados num reduzido número de blogues, enquanto a galáxia da direita não pára de aumentar, sendo até mais organizada (veja-se a criação da União dos Blogues Livres - organização interblogacional contra o perigo totalitário marxista na blogosfera, que congrega dezenas de blogues).

"A vida política é uma chatice"
A disparidade política, contudo, pode também ser desvalorizada e entendida como mais um elemento de uma "realidade mais complexa". Pelo menos, é esta a posição de Pacheco Pereira (abrupto.blogspot.com), que, nas suas reflexões sobre blogues, escreveu o seguinte: "O que se passa em alguns blogues políticos é que existe uma forte tendência auto-proclamatória, de auto-classificação, que acompanha quase sempre uma maior pobreza analítica, a dificuldade de pensar a política como uma actividade complexa, que, em territórios como estes, só sobrevive se for associada a uma mais vasta perspectiva cultural e social. Quem chega assim tem a tentação de plantar a bandeira logo, marcar o território e escolher lado. Depois faz sempre batalhas de posição, e essas batalhas não nos ensinam nada".

A resposta a esta e a outras considerações de Pacheco Pereira veio de O País Relativo (paisrelativo.blogspot.com) - "as juventudes do PS", como o eurodeputado do PSD insinua na sua última crónica no PÚBLICO -, assinada por Rui Branco e Pedro Machado: "O melhor dos leitores de Bourdieu, Pacheco Pereira marca a agenda do que há e não há para discutir, (só) propõe temas de relevo e reserva para si certos tópicos apetecíveis. Esta tentativa para impor como legítima uma certa (a sua) visão das divisões e para apresentar como natural aquilo que resulta de uma (a sua) construção revela uma pulsão totalitária iniludível. O Abrupto quer transformar-se na rotunda dos Produtos Estrela da blogosfera e Pacheco no seu polícia sinaleiro".

Independentemente das divergências, os blogues políticos continuam a enfileirar-se na dianteira dos blogues mais visitados. Os novos contornos do debate magnetizam a curiosidade da maioria dos visitantes e daí deriva uma profícua interactividade entre bloguistas e leitores. Seja através das caixas de comentários disponibilizadas por alguns blogues, seja através do envio de e-mails. E note-se que entre os blogues marcadamente políticos, são extremamente ténues as colagens partidárias, sendo até, em alguns casos, recusadas. Para João Pereira Coutinho, da desaparecida Coluna Infame (ver caixa), a gradual abertura de blogues por políticos explica-se assim: "A vida política é uma chatice, um tédio. São vidas tristes". Na blogosfera, por enquanto, ainda não há rumores entediantes.

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Um Fenómeno com Seis Anos/ANÁLISE
Por ANTÓNIO GRANADO*
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

Quando Dave Winer fez aquele que é considerado o primeiro "post" de sempre num weblog, no já longínquo dia 1 de Abril de 1997, estava certamente longe de imaginar o fenómeno global que iria desencadear. Desde o início da World Wide Web que muitos cibernautas faziam as suas páginas na Internet e aí colocavam ligações para outras páginas que consideravam interessantes. No entanto, apesar desta ligação próxima, as primeiras páginas construídas na WWW não podem nem devem ser consideradas como sendo os primeiros exemplos de weblogs. A palavra weblog - como sinónimo de uma página ordenada cronologicamente, onde um autor coloca periodicamente as suas próprias ideias ou ligações para outras páginas que considera interessantes - só aparece pela primeira vez em Dezembro de 1997 pela mão de Jorn Barger.

No entanto foi preciso esperar dois anos para que as coisas tomassem um rumo nunca antes esperado. No dia 23 de Agosto de 1999 foi criado o Blogger.com, uma ferramenta gratuita para criação de weblogs, que revolucionou a edição de textos na Web. Em 3 de Setembro de 2000, a Pyra acrescentou a cereja em cima do bolo ao criar o Blogspot.com, um "site" que aloja gratuitamente milhares de weblogs, em troca de anúncios colocados no topo das páginas. O sucesso foi tal que, em pouco mais de dois meses (a 7 de Novembro de 2000), o Blogspot viu nascer o seu 10.000º blog.

Na passada semana, o Blogger anunciou que tem 1,5 milhões de utilizadores registados, ainda que muitos weblogs não tenham mais do que alguns "posts", ou tenham sido abandonados há muito. Aliás, várias tentativas têm sido feitas ao longo dos anos para descobrir quantos weblogs estão activos no mundo inteiro. Uma das mais sérias tem algumas semanas e pode ser consultada no endereço http://www.idlewords.com/crawler/crawl_report.pl . Na altura em que o consultei para escrever este artigo, contavam-se 463.994 blogs, sendo o português actualmente a segunda língua mais falada na blogosfera, muito por culpa dos brasileiros.

Em Portugal, o fenómeno dos weblogs terá começado no início de 1999. Ao contrário do que podem fazer crer alguns artigos publicados em jornais e revistas nos últimos meses, os blogs sobre jornalismo ou política estão longe de ser a maioria ou de sequer terem iniciado a moda em Portugal. Há alguma discussão entre os cibernautas sobre o que é ou não um weblog mas, seja qual for a definição que adoptemos, entre os primeiros "sites" portugueses a aderir a este fenómeno estão certamente o Macacos Sem Galho, o Gildot.org, o Dee's Life, o Altas Doses de Cafeína, o Nonio.com, o Velouria.org, o Sonhos Virtuais e o Hiperbock, todos criados ainda no século passado.

Mas não há dúvida nenhuma que 2003 marca a data da explosão dos weblogs em Portugal. Em Janeiro deste ano, Pedro Fonseca criava aquela que é a mais fiável lista de weblogs lusos, em http://blogsempt.blogspot.com . Tinha na altura cerca de 150 blogs indexados. Na última consulta que fiz tinha 690. E nem sequer vale a pena fixar este número porque, na sequência deste destaque do PÚBLICO e de outros artigos que durante esta semana serão publicados noutros órgãos de comunicação social, o número crescerá - como é costume acontecer sempre que os media falam de blogs -, e arriscava-me mesmo a dizer que ultrapassará os 1000 antes do final deste mês.

A este súbito interesse dos media pela blogosfera, e consequentemente dos seus leitores, não é alheio o facto de, nos últimos meses, algumas personagens mediáticas terem criado o seu próprio weblog. Depois dos blogs de política, à esquerda e à direita (que nasceram como cogumelos), foi o aparecimento do Abrupto - http://abrupto.blogspot.com - de José Pacheco Pereira que trouxe para a ribalta este fenómeno até então circunscrito a umas centenas de aderentes em Portugal. Goste-se ou não do que escreve o seu autor, não há dúvida que depois do nascimento do Abrupto se nota uma maior efervescência na blogosfera portuguesa, com weblogs a serem criados todos os dias, tornando impossível o seu acompanhamento mesmo pelos mais dedicados cibernautas.

Esta explosão trará inevitavelmente crises de crescimento. Haverá weblogs que não compreenderão o ambiente de crítica aberta que se vive na blogosfera, outros que não estarão preparados para persistir na exigente tarefa da escrita diária, outros ainda que se cansarão facilmente de escrever para leitores imaginários que nunca (ou quase nunca) aparecem - é bom nunca esquecermos que o acesso à Internet é ainda um privilégio de uma fatia muito estreita da população. Mas a pluralidade de vozes que esta explosão trouxe à Internet portuguesa só pode ser positiva, como é positiva a pluralidade de órgãos de comunicação social na esfera pública. Como acontece com outros sectores da sociedade, os mais bem escritos, mais interessantes, mais persistentes resistirão e ganharão cada vez mais credibilidade. Os outros desaparecerão sem deixar qualquer rasto. Será a selecção natural aplicada à blogosfera.

*Jornalista do PÚBLICO e "weblogger" desde Janeiro de 2001
P.S. - Agora que o artigo terminou, talvez se tenha tentado a criar o seu próprio weblog, para ver como é. Sente-se ao computador, ligue-se à Internet, vá a http://www.blogger.com e inscreva-se. Em menos de cinco minutos, terá o seu próprio blog para escrever o que lhe apetecer. Seja bem-vinda/o.

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Os Blogues da Discórdia
Por MARIA JOSÉ OLIVEIRA
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

Fazer uma selecção na blogosfera não é tarefa fácil. O PÚBLICO escolheu, de entre os blogues politizados, sete espaços onde os textos revelam maior consistência. E optou por manter a Coluna Infame, apesar do seu recente desaparecimento. O fecho deste blogue não lhe retira importância nem estanca os seus efeitos, pelo que é legítima a sua inclusão nesta mostra.

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Pacheco Pereira "Perde Tempo" com Blogues
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

abrupto.blogspot.com

Quando Pacheco Pereira chegou à blogosfera, nos primeiros dias de Maio último, a incredulidade tomou conta dos bloguistas. O eurodeputado encontra uma explicação para o cepticismo: "Fiquei com a ideia que achavam pouco provável que alguém com fácil acesso aos outros meios de comunicação e com muito que fazer, não iria 'perder tempo' num blogue. Durante alguns dias prolongou-se uma discussão em torno da verdadeira identidade da abreviatura JPP. Até ao "post" de 7 de Maio, no qual o eurodeputado do PSD decidiu "tirar todas as dúvidas": em jeito de pré-publicação, transcreveu o primeiro parágrafo do texto que havia escrito para o PÚBLICO e que seria publicado no dia seguinte. As reacções efusivas não se fizeram esperar.

No excerto do soneto de Sá de Miranda, que serve como cartão de apresentação do Abrupto - "m'espanto às vezes, outras m'avergonho" - e nos "posts" debutantes do blogue, Pacheco Pereira levantou o véu sobre as suas propostas de reflexão. Que vão desde tertúlias literárias virtuais, passando por comentários sobre a actualidade nacional e internacional, até a mini-análises do fenómeno bloguístico. Desenganem-se, pois, aqueles que julgam ali encontrar textos testamentários exclusivamente sobre política. Denunciando que, "nos últimos 20 anos", chegou a utilizar o pseudónimo de Abrupto para discorrer sobre arte, literatura e cinema em "vários obscuros jornais e revistas", Pacheco Pereira afirma: "Existe uma ideia muito reducionista do que é a actividade política e do que são os políticos". E interroga: "Porque razão é que de mim se espera que eu fale apenas de política?".

Pacheco Pereira foi o primeiro político a entrar na blogosfera. Para já, o vice-presidente do Parlamento Europeu parece retirar satisfação da "verdadeira dialéctica" com o exterior. E não esconde um certo orgulho: "Não me queixo da resposta de quem me lê. O Abrupto teve já cerca de 25 mil 'pageviews' em duas semanas". É obra.

Além do Abrupto, que é actualizado quase diariamente (as pausas acontecem por obrigação das constantes viagens), Pacheco Pereira abriu recentemente o Estudos sobre o Comunismo, blogue homónimo de uma publicação editada entre 1983 e 1985. A ideia de ressuscitar a revista, dedicada ao estudo científico do comunismo, em formato "on line" era já um "projecto antigo". "Arranquei com o blogue como instrumento de trabalho regular, em contacto com outros investigadores", conta, acrescentando, porém, que a versão virtual serve apenas como "instrumento activo de investigação e registo bibliográfico". A intenção é, afirma, "agrupar num sítio mais estável os produtos finais". O Abrupto, esse, vai de vento em popa, ascendendo à galeria dos blogues mais visitados. Apesar da larga afluência de leitores, Pacheco Pereira diz que o Abrupto "é um entre 500".

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Blogue Familiar
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

blogue-de-esquerda.blospot.com

Nasceu no primeiro dia do ano. E seis meses depois, o "Blogue" de Esquerda (BdE) recebe já cerca de 400 visitas diárias, numa impressionante contabilidade somente partilhada com a Coluna Infame (entretanto dissolvida), o Abrupto e o Blogue dos Marretas. O seu "cartão de visita" refere que ali se escreve sobre "Política, Cultura, Ideias, Opiniões, Manifestos e Etc." - e neste "etc" cabem por vezes trechos sentimentais. Adiante.

Os irmãos José Mário Silva, 31 anos, jornalista e poeta, e Manuel Silva, 26 anos, doutorando em Ciências Musicais, em Paris, são os autores do BdE, que conta também com as colaborações regulares de Daniel Oliveira, Sandra Augusto França, Filipe Moura e Fernando Venâncio. Perante a corruptela da sua denominação, há uma questão que se impõe: qual a relação do "Blog" de Esquerda com o Bloco de Esquerda? José Mário esclarece: "Existe uma proximidade ideológica, mas fizemos questão de não ter qualquer ligação ao Bloco. Até porque em muitos aspectos não estamos de acordo com as linhas do BE. É preciso separar as águas", diz. E acrescenta: "Isto é um espaço de liberdade a sério". Um espaço que, segundo o "post" inaugural, aspira a tornar-se num "fórum aberto a todos os que se sentem à esquerda das esquerdas convencionais".

A intenção estendeu-se igualmente à direita e, na verdade, outra coisa não seria possível, já que o mapa político da "blogosfera" tem vindo a ser dominado pelos conservadores (e demais variações). Facto para o qual José Mário Silva não encontra muitas explicações. Tem, no entanto, uma certeza: "Na 'blogosfera' não existem diferenças sociais, culturais ou geográficas. Não se trata de um reflexo da sociedade, mas se pegarmos em 20 ou 30 blogues é possível traçar um perfil". Entre outras disparidades que podem ser nomeadas, aquela que adquire um cariz mais estimulante é a que envolve o debate político. Basta espiar as reacções dos bloguistas - por vezes, um "post" leva a outro e a outro e a outro - e o elevado índice de comentários suscitados pelas questões políticas e partidárias.

Há muito que José Mário se faz acompanhar de um caderninho, daqueles onde se vai anotando frases e pensamentos soltos. Agora, as folhas brancas servem também para esboçar os "posts" diários do BdE. José Mário admite: "Isto é viciante". E isso traduz-se numa das primeiras impressões que revela - "Tenho a sensação que faço isto há dois anos".

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Primus Inter Pares
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

colunainfame.blogspot.com

A denúncia da tortura e a tradução da crueldade da Inquisição no século XVII singularizaram "A história da coluna infame", livro seminal de Alessandro Manzoni, romancista, poeta e político do século XIX. Entende-se, pois, como reveladora a escolha do título do blogue de Pedro Mexia, Pedro Lomba e João Pereira Coutinho: em várias dimensões, a Coluna Infame foi pioneira e ímpar, tendo mesmo involuntariamente contribuído para experiências miméticas.

Com um número de visitas que ascendia a meio milhar por dia, o blogue depressa se converteu numa referência incontornável, sustentada pela qualidade dos seus textos. Gravitando em torno das artes, da política ou da literatura, a Coluna Infame, posicionada na direita conservadora, revelou escritos pertinentes, críticos e desafiantes, ao mesmo tempo que, porventura sem esse propósito, ganhou funções didácticas.

Os três autores acabaram por transformar a relação do leitor com o blogue numa discussão contínua que manteve desperto o espírito crítico e o "prazer intelectual", aludido por Mexia, era notório. Sem uma obediência estrita à actualidade, a Coluna Infame permitiu "ressuscitar um certo tipo de escrita" baseado na "precisão e concisão", explicou Pedro Lomba, admitindo que espera "daqui a uns anos saltar para um jornal".

Apesar de as questões políticas não terem sido dominantes, foram elas que provocaram as maiores controvérsias com outros bloguistas. "Sou defensor de uma certa agressividade", apontou Mexia. Não poucas vezes, João Pereira Coutinho foi acusado de assumir posições extremistas ou de ser demasiado truculento e agressivo. "Esses comentários provêem de uma certa ignorância histórica. Os 48 anos de ditadura retiraram a política das ruas", argumentou, sublinhando que continua a estranhar-se a "frontalidade". "Se lessem a prosa jornalística da I República, viam que eu não passo de um menino de coro", acrescentou.

A Coluna Infame acabou no passado dia 10. Um desentendimento interno e uma consequente cisão resultou no fecho do blogue. Mas há novidades: Pedro Mexia já regressou, a solo, com o dicionariodiabo.blogspot.com; Pedro Lomba, também a solo, confirmou já o seu retorno; e João Pereira Coutinho prepara-se para abrir um "site" pessoal com várias componentes, entre elas um blogue, um arquivo de textos seus publicados nos últimos sete anos e "links" para várias publicações.

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Agência de Notícias da Blogosfera
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

cruzescanhoto.blogspot.com

O Cruzes Canhoto! é um daqueles blogues que deixam o leitor a balançar entre a estupefacção e a pergunta "mas estes tipos não fazem mais nada?". Explique-se: a escrita diária de "posts" é não só pautada por um impressionante acompanhamento da actualidade (nacional e internacional), como também se faz acompanhar por um ou mais "links" que remetem para as mais variadas moradas da Net e poupam trabalho ao visitante.

A mega-produção do Cruzes é assegurada por apenas duas pessoas - Nuno Guerreiro (assina N), 30 anos, bibliotecário, e Jorge Palinhos (J), 25 anos, coordenador editorial - e tem a sua base no Porto, embora os dois bloguistas sejam naturais de Lisboa e Leiria, respectivamente. O trabalho de ambos explica a assiduidade dos "posts" e a remissão para informações veiculadas por órgãos de comunicação nacionais e internacionais: "Estamos junto de terminais e por isso é mais fácil fazer um trabalho de 'posts' intermitente", conta Nuno Guerreiro.

Criado em Fevereiro deste ano, o Cruzes foi concebido devido àquilo que Guerreiro chama um "desequilíbrio de forças ideológico" na blogosfera. Tendencialmente de direita, acrescenta. Tal como a sua própria denominação sugere, o blogue assume uma posição política de esquerda, embora o faça "sem cartilhas", ressalva. "Existem muitas clivagens nos blogues de esquerda. Parece que estão a pegar numa cartilha", diz. Mas nota, porém, que a "novidade" da generalidade do diálogo político na blogosfera é precisamente o seu "descomprometimento".

O cariz marcadamente informativo do Cruzes Canhoto não se reduz, contudo, à actividade política. A partir de uma base de dados ancorada em jornais, televisões e publicações internacionais, o blogue serve também como meio de divulgação dos mais diversos assuntos. "Impenitentemente impertinente, inclinado sobre a política, a sociedade e a cultura", pode ler-se, em jeito de sub-título.

Os dois autores criaram ainda uma pequena "janela" com as "últimas notícias" e uma longa lista de links para outros blogues portugueses e estrangeiros, dividida em vários módulos de apresentação: "Pacto de Canhotos", "Aliança de Fachos", "Blogues Desalinhados", "Mecoblogues", Biblogues" ou "Irmãos e Amigos".

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Animal, Statler e Waldrof Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

marretas.blogspot.com

O contador marcou 10 mil visitas no dia 13 de Maio. A celebração fez-se com um comentário, intitulado "Os três marretinhas de Fátima", que terminava assim: "O mundo está mesmo perdido". Actualmente, o Blogue dos Marretas ultrapassou já a fasquia das 20 mil visitas e cerca de três meses volvidos sobre o seu aparecimento, não se pode apontar falta de entusiasmo ao trio de autores, baptizados com os nomes de Animal, Statler e Waldorf.

A escolha da designação do blog e dos pseudónimos surgiu defronte de um "Happy Meal" da Macdonald's - a embalagem oferecia bonecos dos Marretas em borracha. Pelo menos, é esta a versão contada por um dos seus criadores. Sob a "máscara" das personagens da série televisiva (e com o mesmo cariz desconcertante) encontram-se Jorge Bacelar (Animal), 43 anos, Nuno Jerónimo (Statler), 31, e João Canavilhas (Waldorf), 37, amigos de longa data e professores na Universidade da Beira Interior, na Covilhã.

No Blogue dos Marretas, o terreno ideológico ostenta uma fronteira: dois de direita (Statler e Waldorf) e um "infiltrado" de esquerda (Animal). "Criámos facções: os velhotes são à direita e eu sou assumidamente de esquerda", conta Jorge Bacelar. Resultado: "Já dizemos que somos serviço público".

Pese embora as divergências, que tiveram especial relevância no período da guerra no Iraque, os Marretas preservam uma cumplicidade que se nota sobretudo no tom humorístico dos "posts". "No início pensámos em discutir com seriedade. Até descobrirmos que nos achavam graça", diz Nuno Jerónimo. Seja sobre política, cidadania, educação ou cultura, os autores raramente escrevem sem pertinência. "Tentamos dar aos comentários um tom jocoso, provocatório e talvez as pessoas apreciem o nosso sentido de humor", afirma Bacelar.

A abordagem da actualidade política, reincidente neste blogue, promove uma elevada interactividade com os leitores e devolve aos seus criadores um efectivo debate de ideias: "Aqui na Covilhã a realidade é completamente diferente daquela que existe em Lisboa ou no Porto. Do ponto de vista pessoal, alargou o leque de pessoas com quem me confronto", explica Nuno Jerónimo.

Da experimentação ao vício foi um pequeno instante. O Blogue dos Marretas prima por uma actualização diária quase pontual - os visitantes assíduos depressa aprendem os horários de trabalho bloguístico de cada um dos autores - e adivinha-se que continuará assim ainda por muito tempo. Jorge Bacelar justifica: "Somos bonecos de peluche, se nos cansarmos deste brinquedo vamos brincar para outro lado. Mas neste momento é difícil, pois sentimo-nos muito bem".

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

A Esquerda Relativa
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

paisrelativo.blogspot.com

Resgata o título de um poema de Alexandre O'Neill, "O País Relativo", e nele embarcam Filipe Nunes, Mariana Vieira da Silva, Mark Kirkby, Miguel Cabrita, Pedro Adão e Silva, Pedro Machado, Rui Branco, Sílvia Sousa, Tiago Tibúrcio, Domingos Farinho e Luís Filipe Borges (este último saiu entretanto e já fundou o blogue Desejo Casar).

Poder-se-ia repescar a frase de Manuel Alegre - "não somos independentes na esquerda" - para apresentar o País Relativo. Entre os seus criadores, amigos de longa data, encontram-se militantes do PS (um deles dirigente nacional e um outro chefe de gabinete de Ferro Rodrigues), mas não se julgue que a actividade ou o discurso partidário ensombram este blogue, nascido em finais de Fevereiro. Apesar das infundadas reivindicações de textos de índole político-partidária, lançadas por muitos leitores, os bloguistas estendem a sua escrita a temas tão diversos como o cinema, as viagens, a literatura ou a música. "As pessoas não podem comparar o País Relativo à Acção Socialista: não é nem nunca será", diz Rui Branco, historiador a viver em Florença. Como se pode ler no "post" inaugural do blogue, a "trespassante lucidez e actualidade" do poema de O'Neill, que descreveu um Portugal sorumbático e fragilizado, são motivos para a exposição de ideias e para o arranque de debates interactivos. Embora Mariana Vieira da Silva admita que "gostava que existisse na blogosfera um maior equilíbrio entre a direita e a esquerda", não é por essa razão que as discussões esmorecem.

Rui Branco explica que o modelo bloguístico revisita um método de debate do século XIX: "Os parlamentares eram muito mais cultos do que actualmente e tinham uma forma de discutir, com grande vivacidade, que está a regressar agora nos blogues". Sublinhando a "saudável convivência" e a "crítica irónica" que agora ressurge, o historiador aponta ainda que, em alguns casos, o diálogo é "uma lição de Estado". E remata: "É uma espécie de blogues dos fillhos da madrugada e isso revela um espírito diferente. Desde logo porque não somos info-excluídos".

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Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

É Um Blogue Português com Certeza
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

noquintodosimperios.blogspot.com

Quem é de esquerda tem "mais facilidade" em escrever na imprensa escrita. Logo, os de direita utilizam os blogues porque "não têm acesso" a outros espaços de publicação. Quem o diz é Diogo Henriques, um dos autores do blogue No Quinto dos Impérios, que, embora tenha nascido há pouco mais de um mês, é já um dos sítios mais visitados da blogosfera. Paradigma da aldeia global (à escala europeia, refira-se), o blogue é mantido por mais quatro dinamizadores (além de Diogo Henriques, de Lisboa), espalhados em diferentes geografias. A saber: Fernando Albino, em Londres, João Vacas e Miguel Borges de Freitas, ambos em Bruxelas, e Francisco Mendes da Silva, que vive entre Coimbra e Viseu.

Para além de refrear o distanciamento físico, o blogue ilustra igualmente as ideias políticas dos cinco amigos, todos eles filiados no PP. Mas a participação política activa não condiciona, assegura Diogo Henriques, a profusão e o conteúdo dos "posts". "O debate político é mais rápido, mais descomprometido e não segue uma disciplina partidária", afirma.

Com um título inspirado no padre António Vieira ( não em Fernando Pessoa), o blogue apresenta-se como "liberal e conservador", recolhendo ainda estes epítetos duas correntes: "Tradicionalista ou democrata-cristão". E ressalvam que as empatias variam "consoante os dias e as assinaturas". Escrevem que não são "saudosistas" - têm, antes, saudades "da nossa horta à beira-mar plantada" - e saúdam os leitores "como o lindo azulejo de uma casa portuguesa: seja bem vindo quem vier por bem".

Apesar da militância activa dos bloguistas - que se revela, muitas vezes, em referências "irónicas" à Nova Democracia, de Manuel Monteiro -, o No Quinto dos Impérios é um lugar abrangente, onde se prodigaliza a "partilha de experiências e de heróis", declara Diogo Henriques, acrescentando que o diálogo estende-se muitas vezes a afinidades culturais. E o cruzamento de opiniões faz-se segundo um estilo de escrita "que estava muito perdido", sustentado em "bases diferentes" e propício a "discussões estimulantes".
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Fonte: Diário Económico

Internet
Portugal adere em força aos 'weblogs'Por Carlota Mascarenhas

A política é o tema mais discutido nos 'weblogs', devido à liberdade de
expressão.


Portugal está cada vez mais presente na blogosfera, contando já com mais 400
'weblogs' nacionais sobre os mais variados assuntos, desde política, à
cultura, passando pelo humor. O fenómeno nasceu no dia 1 de Abril de 1997 -
data considerada como a primeira entrada num 'weblog' a nível
internacional - pelas mãos de Dave Winer que criou o «Scriptting News
Archive».
Chama-se 'blog', abreviatura de 'weblog', a qualquer registro frequente de
informações na internet. Um dos factores atractivos nos 'blogs' é o facto de
permitir aos utilizadores publicar conteúdos sem ter que dominar a
construção de páginas na Internet, sem conhecimento técnico especializado.
Foram também surgindo alguns 'blogs', como o «Blogs em .pt» e o
«blogo.no.sapo», que funcionam exclusivamente como apontadores, detectando o
aparecimento de novos 'weblogs' portugueses.
No «blogo.no.sapo», existe mesmo um sistema de categorização e apreciação da
blogosfera nacional. Segundo o apontador, na categoria de Actualidade, o
ingrediente principal é a actualidade nacional ou internacional, debatida
num registo opinativo, abarcando temas como a política, economia, desporto,
justiça, religião ou os media. Aqui destacam-se 'blogs' como o «Ponto
Média», do jornalista António Granado, o «Abrupto» de José Pacheco Pereira,
o «Coluna Infame», que nasceu pelas mãos de Pedro Mexia ou o «De Esquerda»,
mantido por Pedro Crespo.
Boa disposição e provocação são as palavras de ordem nos 'blogs' que constam
da categoria Humor, onde se discute política, cultura ou actualidade, sempre
de forma mais «incisiva», como refere o «blogo.no.sapo». 'Blogs' como o
«Blogue dos Marretas» ou o «Gato fedorento», tratam a informação com bom
humor, uma pitada de ironia e um toque de sarcasmo. No caso das Artes e
Letras, «Bisturi», «Freira Dadaísta», «Real Absoluto» ou «Prazer Inculto»
são alguns dos 'weblogs' cujo o espaço é dedicado à reflexão sobre a
cultura, desde a construção das letras à divulgação das artes.

Os «nossos» 'blogs'
Foi graças a um texto publicado na Internet, enumerando instruções para
criar um 'blog', que Pedro Mexia criou a «Coluna Infame», que surge em
Outubro de 2002, altura em que existiam cerca de 200 'weblogs' em Portugal,
mas nenhum de cariz político. «Achava piada fazê-lo e depois do 11 de
Setembro achei que o momento de repolitização era oportuno», frisa Pedro
Mexia. Sublinhando que em Portugal os jornais evitam o jogo da
independência, não tendo, portanto, posição editorial, o fundador da «Coluna
Infame» acredita que, nos 'blogs' essa tendência é assumida. «É a
simplicidade e a liberdade de expressão», frisa Pedro Mexia. Salientando que
os 'blogs' nacionais foram alvo de uma subida de atenção com o surgimento do
Abrupto, de Pacheco pereira, Pedro Mexia refere que há a tendência perigosa
de presumir que as coisas feitas e ditas por figuras públicas são melhores.
«Os melhores textos que leio nos 'blogs são, sem dúvida, de ilustres
desconhecidos».
O «De Esquerda», mantido por Pedro Crespo, inclui-se também nos 'blogs'
políticos. Caracterizando os 'weblogs' como um espaço de intervenção
digital, grátis e de fácil utilização, o autor do «De Esquerda» acredita que
a língua portuguesa tem uma presença forte no mundo dos 'blogs', apesar da
blosfera lusa ser ainda pequena. «Grande parte dos 'blogs' são para consumo
interno, para distribuir pelos amigos (.), mas os outros são, a meu ver, os
mais interessantes, com espaços de discussão e reflexão sobre temas
genéricos e actuais», frisa.
Pedro Crespo refere que há hoje uma comunidade de 'blogs', donde se criam
oposições de estimação, como Direita vs Esquerda. «Acabamos por repartir
entre nós os leitores». Frisando que os 'blogs' não ameaçam a imprensa
escrita nem a rádio ou televisão, Pedro Crespo resume os 'blogs' a uma
camaradagem saudável em que todos se tratam por tu, mesmo quando não se
concorda. «No De Esquerda posso discordar das medidas que o governo de
direita implementa e sugerir propostas, recomendar último livro do Ohran
Pamuk ou um restaurante na zona ribeirinha do Porto».
«O Quinto dos Impérios» é um dos 'blogs' recém-nascidos na blogosfera
nacional pelas mãos de cinco amigos com vontade de discutir política e falar
de coisas que o jornalismo tradicional não aborda normalmente. Diogo Belford
Henriques, Fernando Albino, Francisco Mendes da Silva, João Vacas e Martim
Borges de Freitas criaram um novo 'blog', também de cariz político. «O
Quinto dos Impérios» surgiu para fazer política, discutir a actualidade e
para nos mantermos mais ou menos juntos e atentos à realidade nacional,
visto que agora vivemos em três países diferentes», acrescenta João Vacas.
Sublinhando que os 'blogs' são «uma ameaça interessante ao conceito
tradicional de jornalismo e um desafio para quem tem que idealizar e dirigir
publicações e programações atractivas», os autores acreditam que a
blogosfera permite um acesso «mais directo e menos filtrado por linhas
editoriais, ao pensamento e opinião de muitas pessoas de valor».
Passando ao humor, o «Blogue dos Marretas», mantido inicialmente por Statler
(Nuno Amaral Jerónimo) e Waldorf (João Canavilhas), conta agora com Animal
(Jorge Bacelar), todos docentes na Universidade da Beira Interior (Covilhã).
«Tudo começou porque já usávamos blogues como ferramenta de apoio às aulas e
também como campo de investigação», frisa João Canavilhas. A ideia evoluiu e
surgiu um 'blog' onde se analisa a actualidade e o universo dos 'blogs' com
um tom irónico e divertido.
Os «Marretas» acreditam que a massificação da Internet foi um fulcral para a
libertação da opinião, sublinhando que, nesse aspecto, os 'blogs' são a
simplificação do processo técnico, democratizando ainda mais o sistema.
«Pensamos que os blogues terão um impacto muito positivo em vários campos
profissionais e permitirão o aparecimento de novos valores no campo da
cultura», frisa «Walldorf».


Os media em 'blog'

António Granado criou o «Ponto Média» a 2 de Janeiro de 2001. «Há já alguns
meses que seguia o Media News, do Jim Romenesko, e achei que seria
interessante fazer um 'weblog' sobre jornalismo em português», refere o
jornalista, salientando que 2003 será certamente o ano dos 'weblogs' em
Portugal. Actualizado uma vez por dia, o Ponto Média oferece um 'clipping'
diário dos media nacionais e internacionais.
Apesar de ser difícil prever o futuro dos 'blogs' em Portugal, o jornalista
acredita que estamos apenas a assistir ao início do fenómeno. »os media
portugueses só agora acordaram para o fenómeno. Isto tem feito com que, cada
vez que um artigo sobre 'weblogs' sai nos joprnais, sejam criados mais umas
dezenas», salienta António Granado. «Os 'weblogs' pessoais continuarão a ser
criados com bastante frequência e veremos surgir 'photoblogs' ('weblogs'
baseados em fotografias) como cogumelos, actualizados a partir dos
telemóveis com câmara fotográfica. Nessa altura perceberemos o quanto a
nossa privacidade está ameaçada', frisa.
A educação é outra das áreas que, segundo António Granado, começará a
usufruir das vantagens dos 'blogs'. 'Com tantos artigos sobre 'weblogs', os
educadores perceberão o quanto estes podem ser úteis na sua profissão. A
experiência pioneira dos cursos de Comunicação da Universidade do Minho e da
Universidade do Porto serão seguidas por muitos outros cursos e até por
outros graus de ensino'.

cmascarenhas@economica.iol.pt

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segunda-feira, junho 23, 2003
 
Fonte: Público - 23 de Junho de 2003

Direito de resposta electrónico
Conselho da Europa Quer Resposta Obrigatória nos Meios 'On-line'
Segunda-feira, 23 de Junho de 2003

Por Pedro Fonseca

O Conselho da Europa quer ver reconhecido o direito de resposta no mundo "on-line". Isto significa que a comunicação social electrónica, os "newsgroups" e quaisquer sítios na Web - incluindo os "weblogs" pessoais - serão obrigados a ter mecanismos para garantir a resposta a qualquer crítica pessoal ou de uma organização, equiparando-os ao que já sucede nos meios tradicionais de comunicação social. Os tratados estabelecidos pelo Conselho da Europa não são vinculativos mas os 45 Estados-membros (entre os quais, Portugal) tendem a adoptá-los - no caso europeu por via comunitária, como sucedeu com a convenção do cibercrime.

A proposta sobre o assunto foi levada na semana passada a reunião pelo grupo de especialistas de serviços e democracia "on-line" (MM-S-OD) e revelada pela CNet.com a 16 de Junho, quando se iniciou a reunião. O MM-S-OD é coordenado por um grupo de 10 países, de que Portugal faz parte. No documento proposto para discussão, elaborado a 21 de Março e redenominado "Proposta de recomendação sobre o direito de resposta nos média 'on-line'" ( www.coe.int/t/e/human_rights/media/1_Intergovernmental_Co-operation/02_Draft_texts/MM-PUBLIC(2003)002%20E%20Right%20of%20reply.asp ), considera-se esse direito mesmo no caso de não haver "actualização regular ou periódica da informação", derivado da "possibilidade de correcção instantânea da informação contestada". Esse direito é reconhecido a "qualquer pessoa natural ou legal referida por um média 'on-line'."

A proposta define "média 'on-line'" como qualquer pessoa ou entidade cuja actividade vise recolher, editar e disseminar informação ao público através da Internet - definição de tal modo abrangente que abarca desde o sítio na Web do Presidente da República ao "blog" de um jovem que coleccione anedotas - enquanto informação é definida como qualquer declaração de facto na forma de texto, som e/ou imagem.

Recomenda-se ainda aos Estados que adoptem a obrigatoriedade de estes meios electrónicos conservarem uma cópia da informação publicada, "pelo menos enquanto um pedido para inserir uma resposta possa ser legalmente feito", num tempo razoável após a publicação. A medida parece estranha porque, mesmo que o autor pretenda retirar uma página da Web com ofensas, deverá mantê-la em público até o ofendido responder.

Os média "on-line" serão também obrigados a indicar, de forma acessível, o nome e os elementos de contacto de um responsável pela gestão das respostas. Isto implica, por exemplo, que sítios na Web de organizações cujos membros preferem o anonimato - dissidentes chineses na Europa, por exemplo - sejam obrigados a divulgar o contacto de um deles.

No princípio 5, estabelece-se ainda que as regras precisas de inserir a resposta devem ter em conta as especificidades técnicas dos média "on-line", nomeadamente um destaque semelhante ou uma hiperligação na mesma "localização onde a informação contestada surgiu inicialmente", na "home page" do média afectado ou numa parte claramente identificada do sítio na Web dedicado ao direito de resposta. A hiperligação deverá ser simples ou com acesso directo ao sítio na Web onde ela se encontra e deverá manter-se por um período equivalente ao da informação originalmente publicada e nunca por menos de 24 horas. Enquanto se mantiver "on-line", o texto original deverá igualmente apresentar de forma directa a resposta, mesmo que apenas através da referida hiperligação. No caso de uma "newsletter", a resposta deverá ser enviada a todos os que a recebem. A proposta refere ainda que o texto de resposta deverá ser publicado independentemente do seu tamanho.

Entre um primeiro texto proposto em Janeiro e a versão de Março, foi retirada a indicação de estas medidas se aplicarem apenas a "médias profissionais", passando a abarcar todo os "média 'on-line'". Pall Thorhallsson, da divisão de média do Conselho, referiu à CNet que a inclusão dos "bloggers" se deve a terem-se tornado "influentes o suficiente para serem regulados como os seus homólogos no mundo 'off-line'". Por essa razão, foi retirado da proposta o considerando de não ser necessário alargar o direito de resposta aos média "on-line" não profissionais, "cuja influência na opinião pública é limitada".

Numa reunião em Fevereiro sobre este assunto, aliás, o grupo de trabalho relatou que alguns dos intervenientes (cujos nomes não são divulgados) salientaram que "a maioria dos Estados europeus, excepto França e Bélgica, garantiam o direito de resposta apenas contra declarações factuais e não contra opiniões. Alguns países, como a Alemanha, terão problemas constitucionais para irem além disso", refere-se na acta da reunião. Esta questão deverá ter sido clarificada na recomendação final - que, apesar de solicitada por Computadores ao Conselho da Europa, não foi disponibilizada até ao fecho desta edição.

"Algumas publicações geridas por não profissionais podem ser muito influentes e, consequentemente, denegrir as reputações de outras pessoas", explicou Thorhallsson. "Pode ser precisamente contra estas publicações que é necessário ter um remédio. É verdade que pode parecer pesado para um 'blogger' ser obrigado a assegurar o direito de resposta. Alguns sugeriram que uma solução podia ser um acordo entre os indivíduos e os seus fornecedores de acesso [à Internet] para a administração do direito de resposta".

Visto dos EUA - país que é apenas observador no Conselho da Europa -, "os 'eurobloggers' que desejem usar os seus nomes verdadeiros poderão ter azar", escreve-se na CNet. "Para o melhor e o pior, falta à Europa uma Primeira Emenda", como a que, na Constituição, protege a liberdade de expressão naquele país.

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O texto de Pedro Rolo Duarte, no DNA.


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Fonte: DNA - Diário de Notícias, 14 de Julho de 2003

Os Blogues: Belo De Se Ver
Por: Miguel Esteves Cardoso

Se eu vos disser que não me lembro de andar tão excitado desde o meu contrabando da matriz do "Closer" dos Joy Division, escondido numa fita que dizia "Grupo Folclórico de Monção" na caixa, talvez fiquem com uma ideia de como ando entusiasmado com os blogues portugueses.

Existe nestas crónicas na Internet de muitos novos e velhos escritores uma aragem nervosa e boa que não se respirava desde os tempos do Punk e da New Wave, em que uma grande quantidade de novos autores tomaram de assalto a indústria discográfica através dos méritos antiquíssimos do "faça você mesmo" ou, se quiserem, a velha máxima Victoriana que era "God helps those who help themselves", em que o segundo sentido de "to help yourself" (servir-se à vontade) é mais importante do que o primeiro.

De repente, desapareceram todos os entraves jornalísticos, comerciais e editoriais. Eu bem sei como é difícil encontrar e publicar novos autores, dada a natureza empedernida do sistema de hábitos e expectativas que preside à nossa Imprensa. À nossa e às outras, diga-se.

De repente, temos à nossa disposição, sem trocas de dinheiros, favores ou patrocínios, uma cornucópia de diários e comentários, de ideias e impulsos literários que se podem experimentar e conhecer num só dia - como se fôssemos uma editora abençoada que recebesse diariamente centenas de manuscritos.

Não vou aqui fazer uma lista dos blogues sem os quais já não passo - é coisa que mais bem fica no meu próprio blogue. Mas preciso de explicar porquê, já que estou convencido que aqui reside a grande esperança e o grande perigo para os blogues portugueses.

A relação entre a escrita na Net e a escrita na Imprensa deve ser imediatamente destruída. Quem usar a Net simplesmente para se publicar, escrevendo textos que facilmente se imaginariam numa folha impressa, não está a blogar.

Blogar é escrever num meio terrivelmente aberto - interactivo, instantâneo, espúrio - a partir de um momento terrivelmente particular - o eu, o ser, a alma. É um lindo fogo posto que salta entre a faísca da intimidade e o incêndio público de todas as coisas.

A força do blogue está no facto de não haver mediações; do salto ser puro; da combustão ser total. Não estou a falar apenas do editor, do director do jornal ou da editora, mas também do ardina, da bicha para comprar um livro, dos transportes, do tempo, de todos os obstáculos sociais e materiais que normalmente se interpôem entre um escritor e um leitor.

No mundo dos blogues - que é a Net, tão larga como se quiser mas tão "cosy" como convier - os escritores e leitores confundem-se numa deliciosa comunidade que é o contrário do universo hermético da escrita impressa. Aqui os escritores lêem-se uns aos outros; comentam o que escrevem; entre-ajudam-se e inspiram-se; num panorama que jamais se fixa mas é, devido ao espírito comunitário, mais sólido e leal aos sentidos do que os velhos "tableaux vivants" tradicionais.

Assiste-se diariamente ao fracasso da Imprensa escrita em dar conta da expressão e comunicação na Internet - imaginem só a seca que seria eu afixar aqui uma lista de URLs. Já o contrário não é verdade. Os blogues são o meio ideal para retratar, reflectir e, sobretudo, atacar a Imprensa escrita.

São feitos do fundo da verdade e da alma; em liberdade; por indivíduos, gastando o tempo e a vontade que lhes pertencem para gastar. Estando expostos aos olhos dos outros, raramente têm a atmosfera azeda da gaveta, momentaneamente exposta só para "mostrar" a alguém que possa publicar aquelas palavras.

Não espanta por isso que seja nos blogues que hoje se vê a nossa língua a saltar e a correr, a fazer das suas e das dela e das tuas e das minhas, envergonhando a prosa paralisada que hoje passa por escrita - e por português - nos nossos jornais.

É belo. Belo de ver e belo de ler e belo para escrever.
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quinta-feira, junho 19, 2003
 
Fonte: Público - 19 de Junho de 2003

Espelho Meu, Espelho Meu Por JOSÉ PACHECO PEREIRA
Quinta-feira, 19 de Junho de 2003

"Discussão entre dois 'bloggers': - exibicionista!- voyeur!"Azullog ( http://azullog.blogspot.com/ )

Eu sou suspeito porque também tenho um, mas a explosão dos blogues é um acontecimento importante na esfera pública portuguesa. É mais tarde do que noutros países, mas também não é assim tão tarde - a realidade dos blogues como forma alternativa de comunicação tornou-se conhecida para a opinião pública em geral durante a guerra do Iraque.

Um blogue é uma página pessoal na rede que se desdobra como um pergaminho antigo, organizada de modo cronológico da actualidade para trás. O seu autor (ou autores porque há blogues colectivos) escreve ou coloca fotos, ou músicas, ou qualquer outro produto digitalizado, em entradas diárias que se vão sucedendo de cimo da página para baixo, mergulhando na invisibilidade as entradas mais antigas, ao sabor do cursor. As entradas ainda mais antigas acabam num arquivo, ou seja, fora da página activa. O "software" para fazer estas páginas, e o local para as instalar, é fornecido gratuitamente na sua versão mais simples por várias empresas, e não exige qualquer conhecimento especializado de informática. Quem tiver um computador ligado à rede e um processador de texto pode fazer um blogue em meia hora, sem gastar nada.

Os actuais autores de blogues não sabem a felicidade que têm de ter esse instrumento, porque eles são a realização de um sonho que parecia inatingível para gerações de estudantes com pretensões intelectuais do liceu e da universidade: ter uma revista literária, um jornal onde se pudesse escrever o que se quisesse. Gerações de jovens "litterati" tiveram essa vontade, alguns realizaram-na com enorme esforço. Era muito caro, os procedimentos para publicar burocráticos e onerosos, as tipografias a chumbo obrigavam a morosas revisões, primeiras provas, segundas provas, linóleos, gravuras, etc., etc. E, num país como Portugal, antes do 25 de Abril, era muitas vezes impossível devido à censura. Eu tive essa experiência e sei como é.

Depois e, num breve instante, deu-se uma revolução. As máquinas de escrever deram lugar aos computadores - imaginem o que era rever um texto e passá-lo "a limpo" -, os processadores de texto evoluíram para o "desktop publishing". A rede realizou outro sonho também inimaginável - o da Enciclopédia Universal em hipertexto, ter o catálogo da biblioteca em linha e ter muitos dos livros em linha, ter o saber todo em linha - e, a crescente passagem do analógico ao digital, unificou num único fio electrónico texto, imagens, música. Depois, "publicar na rede" tem a mais absoluta das audiências potenciais, o mundo todo, e acabou com o problema das tiragens.

Os blogues são um passo neste processo, depois dos "newsgroups", dos "chats", dos boletins em linha e dos diários em linha. A fórmula do blogue, o seu arranjo cronológico, favorece determinado tipo de escrita intimista, mas as suas potencialidades permitem ir mais longe. Há hoje na blogosfera portuguesa de tudo: diários íntimos, diários falsos, diários exibicionistas, blogues obscenos, blogues satíricos, blogues de impressões quotidianas, blogues de futebol, blogues regionais, blogues científicos, blogues de bibliófilos, blogues escritos para serem lidos pelo namorado(a), blogues literários, blogues sobre poesia clássica, blogues sobre o latim, blogues de investigação para doutoramentos, blogues jornalísticos, blogues de estudantes que têm o exame amanhã, blogues de música, arquitectura, direito, economia, psiquiatria, há blogues do partido do dr. Monteiro, do Bloco de Esquerda, das juventudes do PS, monárquicos, reaccionários e esquerdistas, blogues dos amigos de Hayek, dos amigos de Keynes, dos amigos da boa vida sob o signo de Epicuro, etc., etc. Não citarei nenhum em particular, se forem ao Blogues em PT ( http://blogsempt.blogspot.com/ ) terão a lista em bruto e no Blogo ( http://blogo.no.sapo.pt/ ) uma lista já tratada por categorias.

A blogosfera, um neologismo aceitável porque transmite a ideia "atmosférica" e comunitária que os blogues ainda são, reflecte as correntes do resto do espaço público mais do que muitos dos autores de blogues pensam. Para além do carácter estético e literário de muitos textos, da utilidade dos blogues para o trabalho científico, do seu papel como "media" alternativos, eles aumentam a informação, e não são uma mera continuidade do "mundo exterior", acrescentando dimensões novas.

Na blogosfera há muitos relatos de eventos que nunca chegam aos jornais ou que, quando chegam, são aqui vistos com outros pontos de vista alternativos. Nos últimos dias, pude acompanhar vários eventos, desde colóquios na Feira do Livro, a um concerto de Baremboim no Carnagie Hall, pelo olhar dos blogues. É o relato muitas vezes pessoalíssimo, subjectivo, interessado, demasiado próximo? É, mas e o dos jornalistas acaso é diferente? É verdade que é um mundo muito juvenil, demasiado lisboeta e às vezes "intelectualizado" no mau sentido, com má-língua de café, mas qual é o problema? Com isso pode-se bem, relativiza-se.

Há também possibilidades novas como a de um discurso crítico sobre a própria comunicação social que não tem qualquer paralelo nos órgãos de comunicação tradicionais. Não é apenas a televisão que é criticada, ou a rádio, mas a imprensa escrita. No último mês, encontra-se na blogosfera abundante material sobre a denúncia de várias operações de desinformação com base em declarações de Wolfowitz, ou na história dos roubos do Museu de Bagdad, ou no número de vítimas da guerra. A imprensa, rádio e televisão que participaram nessas desinformações, ou seja, fizeram mau jornalismo quando não "jornalismo" politizado, continuam impávidas e serenas a repetir as mesmas coisas. Só que já não podem alegar que não sabiam e manter a impunidade.

A imediaticidade do meio também permite uma crítica ou uma reflexão sobre os eventos muito rápida. No caso da conferência de imprensa e da entrevista à RTP de Fátima Felgueiras, vários blogues levantaram no mesmo dia todas as objecções que, uma semana depois, emergiram na comunicação tradicional como se fossem grandes novidades. É verdade que esta imediaticidade também se presta à asneira, mas aí os blogues em nada se distinguem da comunicação social tradicional. Mais: são melhores, porque como são muitos e diferenciados os pontos de vista, a correcção das asneiras é mais rápida.

Como em todos os momentos da história das tecnologias e como aconteceu desde o primeiro minuto com a Internet, florescem as utopias sobre os blogues. O tempo encarregar-se-á de lhes dar um papel e de mostrar o que mudaram e aquilo em que são uma continuidade ou um prolongamento dos "media" tradicionais. Há e haverá problemas éticos suscitados pela margem ténue entre a privacidade e a intimidade, tão propícia a ser ultrapassada pelo carácter intimista da escrita nos blogues, contrastando com a sua total exposição pública. Estes problemas não são distintos de outros já conhecidos pelo carácter de "aldeia global" da rede.

Seja como for, a comunicação na esfera pública ganhou com os blogues. Ainda não tem uma massa crítica estável, mas já tem uma massa crítica instável. É um mundo efervescente, com nascimentos e mortes todos os dias, com um mercado rude de influência e opinião, de relações de poder e guerras intestinas, digno da "mão invisível" de Adam Smith ou de Florença e Veneza dos bons tempos dos Medici e dos Pazzi. Às vezes espreme-se tudo num dia e fica pouca coisa, mas o que fica é bom e fica sempre alguma coisa. O mesmo se passa com o resto da comunicação social - também, quando se espreme, às vezes não fica quase nada. Por isso, os blogues somam.
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terça-feira, junho 17, 2003
 
Fonte: Público - 14 de Junho de 2003

"Warblogs" Interpelam "Medias" Convencionais
Por PAULO MIGUEL MADEIRA E ANA NAVARRO PEDRO
Sábado, 14 de Junho de 2003

A campanha de ocupação do Iraque pelas forças anglo-americanas foi mais um factor de afirmação da Internet como meio de informação, desta vez sobretudo pela mão de repórteres no terreno. "Esta bem poderia ser conhecida como a guerra da Internet", afirmou o editor-chefe da MSNBC, Dean Wright.
Nos Estados Unidos, muitos internautas manifestarem "reservas sobre a capacidade crítica dos correspondentes do seu país e procuraram fontes internacionais de notícias mais equilibradas, ao mesmo tempo que crescia a importância de fontes não convencionais, muito particularmente dos (war)blogs", afirma José Luis Orihuela, professor de Comunicação na Universidade de Navarra. Num artigo publicado num sítio espanhol especializado em comunicação ( http://www.saladeprensa.org/ ), Orihuela conta que, desde os ataques de 11 de Setembro de 2001 aos Estados Unidos, "gerou-se um movimento crítico face à política de segurança interior e de relações internacionais que, canalizado em diários, é conhecido como 'warblogging'".
Durante a campanha no Iraque, vários jornalistas em serviço no terreno mantiveram diários pessoais onde se podia encontrar reportagem no local e relatos das suas experiências, o que fez aumentar a notoriedade deste formato. O mais famoso foi provavelmente o de Kevin Sites (www.kevinsites.net), repórter ao serviço da CNN a quem a estação de televisão acabou por mandar parar de alimentar o seu "warblog", desencadeando uma controvérsia que teve eco nos meios ligados ao jornalismo "online" e em jornais como o "International Herald Tribune" e "Libération".
Dominique Wolton, sociólogo francês, director do Laboratório de Investigação de Comunicação no CNRS (Centro Nacional de Investigação Científica), e director da revista "Hermès", começou por dizer ao PÚBLICO que "qualquer espaço de expressão e de informação suplementar é sempre bom", ao que acrecentou duas observações. "Primeiro, os jornalistas que fazem 'warblogs' são um sintoma do mal-estar dos jornalistas americanos - não vi ainda 'warblogs' de jornalistas franceses, italianos, alemães - , presos entre a versão oficial da guerra e a realidade da guerra. Este sintoma de um desfazamento foi ainda mais revelador no caso do jornalista da CNN em Bagdad, proibido pela sua hierarquia de prosseguir com o seu 'warblog'. Revelador."
No "site" de Kevin, a última entrada estava datada de 21 de Março. Nela, diz que tem de "suspender por algum tempo o seu 'blogging' de guerra". O jornalista garantia que continuava a fazer crónicas das suas experiências na guerra, esperando "chegar a um acordo com a CNN proximamente, para as poder disponibilizar nalgum formato", talvez no mesmo local. Mas no princípio de Maio esta sua página continuava na mesma. A cadeia de televisão, por seu lado, quando questionada sobre o assunto, disse apenas: "Cobrir a guerra para a CNN e as suas 35 redes e serviços internacionais é um trabalho a tempo inteiro, por isso pedimos ao Kevin para por enquanto se concentrar apenas nisso."
Há mesmo sítios que se dedicaram a seleccionar conteúdo dos "warblogs", como o http://warblogs.cc ou o www.warblogging.com. Os argumentos a favor desta nova forma de apresentar informação, crónicas, comentários, prendem-se justamente com ela permitir uma perspectiva mais fresca sobre a realidade, porque menos sujeita aos filtros convencionais no jornalismo. No entanto, esta maior agilidade tem os seus reversos. Por exemplo, falta de controlo de qualidade, que se pode tornar mais problemática quanto ao estabelecimento dos factos (ver PÚBLICO de 4/5/2003). Torna-se mais fácil fazer avolumar boatos e puxar para o lado sentimental.
A este respeito, Wolton é bastante peremptório: "Penso que esta prática é perigosa para a função jornalística. O 'warblog' não é um diário íntimo, porque é lido imediatamente por milhares de pessoas. Mas o tom íntimo dá um género diferente de comunicação, a que é preciso prestar atenção. A lógica da expressão num 'warblog' não me parece ser compatível com a deontologia do jornalismo. A força, e o limite, do jornalismo é de ser sintético, e enquadrado por um programa, um jornal, uma rádio ou uma televisão. Se os próprios jornalistas se põem a saltar a barreira entre informação, emoção e boatos, vão embaralhar o estatuto da informação."
A maioria dos "warblogs" têm no entanto sido feitos por pessoas comuns, que vão relatando as suas opiniões acerca dos factos que lhes chegam sobre um conflito que se desenrolava a milhares de quilómetros. Também aqui, o olhar do sociólogo é crítico: "Os 'warblogs' feitos por não-jornalistas tornam o problema ainda mais grave. A 'expressão', por si só, não é comunicação. Há uma lógica da comunicação que implica compreender a mensagem do outro, o que não acontece sempre num 'warblog'."
Nem todos os "media" lidaram do mesmo modo com esta novidade da blogosfera. Por exemplo, a BBC manteve um "weblog" alimentado pelos seus repórteres no Iraque, que não levantou grande celeuma. E algumas outras grandes empresas dos Estados Unidos, casos da MSNBC ou da Fox News, procuraram pôr nos seus "sites" novos "blogs" dos seus jornalistas e colunistas, conta Susan Mernit num artigo na "Online Journalism Review" ("Kevin Sites and the Blogging Controversy"). Outras grandes empresas, como a AOL Time Warner (proprietária da CNN e da revista "Time") e "The New York Times", "não estão a encarar o 'blogging' como uma forma útil de jornalismo.
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sexta-feira, junho 13, 2003
 
Fonte: Público - 13 de Junho de 2003

O Fim da "Coluna"
Por JOSÉ MANUEL FERNANDES
Sexta-feira, 13 de Junho de 2003

A "Coluna Infame" acabou. A blogosfera está mais pobre. E o país também - mesmo que a maioria nunca tenha ouvido falar nem da "Coluna", nem da blogosfera.

Na vertigem delirante das notícias dos últimos dias - Boaventura Sousa Santos a anunciar que vivemos em "fascismo social", Fátima Felgueiras a dizer-se a primeira presa política pós-25 de Abril, responsáveis políticos a sacudirem a água do capote de uma amnistia mal engendrada em 1999 - o fim da "Coluna Infame" parece um acontecimento menor. Mas não é.

Para os que não conhecem, a blogosfera é um dos mais recentes e interessantes fóruns de debate democrático. Preenchem-na páginas pessoais ou colectivas, criadas na Internet, onde se trocam ideias, informações e sugestões à velocidade própria da net, isto é, em tempo real (para os interessados, ver http://blogo.no.sapo.pt ). Na blogosfera portuguesa a "Coluna Infame" era uma referência fundadora, quer por ser um dos primeiros espaços de debate político desse universo virtual, quer por ser animada por intelectuais de direita. Estas duas qualidades são importantes.

Na verdade, a blogosfera é a mais vibrante das expressões modernas da Ágora ateniense, esse espaço público onde os cidadãos se encontravam para discutir os assuntos que a todos diziam respeito. A blogosfera é mais democrática, mais aberta, mais plural, mais interessante e mais rica do que os espaços de debate da maioria dos meios de comunicação tradicionais, mesmo os famosos fóruns de discussão radiofónicos (para não falar dos talk-shows televisivos). Na blogosfera reage-se à actualidade em cima da actualidade, e o comentário (ou "post") colocado num blog gera quase de imediato uma cascata de reacções. No tempo da blogosfera é, por exemplo, possível denunciar uma mistificação feita em torno de declarações de Wolfowitz de forma tão rápida que a notícia errada não dura senão umas horas no site do jornal inglês "The Guardian".

No caso português e da "Coluna Infame", a sua colocação à direita corresponde à emergência de jovens intelectuais educados nos valores do liberalismo e que representam uma geração que pouco tem a ver com as referências clássicas dominantes, por exemplo, entre os jornalistas e a maioria dos intelectuais consagrados. Contra ela surgiram espaços como o "Blog de Esquerda", sendo que o equilíbrio esquerda-direita neste universo é mais dinâmico e mais real do que na generalidade dos media tradicionais.

A forma como a "Coluna Infame" desaparece também é sintomática: morre porque os seus três animadores se desentenderam quando um deles ultrapassou os limites do cavalheirismo numa resposta a uma provocação do "Blog de Esquerda". Reparem: cavalheirismo. A blogosfera exige abertura de espírito e poder de encaixe, suporta o desabafo mas privilegia o argumento. E permite que adversários políticos se afirmem amigos e se respeitem. Não era pois por acaso que, ontem, na blogosfera se lamentasse a perda de qualidade dos debates e até das mensagens enviadas para os blogs.

Ficamos por isso à espera de novidades do Pedro Mexia, do Pedro Lomba e do João Pereira Coutinho, os animadores da "Coluna"

PS. Miguel Sousa Tavares e António Barreto manifestaram-se neste jornal em 1999 contra a amnistia promovida pelo Presidente Sampaio e aprovada por todos os deputados, alertando para as suas consequências na despenalização de crimes sexuais. Não se diga pois que não se sabia: não se quis saber.
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Fonte: Revista Meios - Maio 2003

COM.MEIOS.ONLINE
"Blogs": o outro lado da Internet
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A recente aquisição da Pyra Labs, a criadora do site www.blogger.com, por parte da empresa Google, sugere fortemente que o blog não é apenas um fenómeno passageiro. Alguns blogs pessoais têm mais visitantes por dia do que páginas de multinacionais. Começa-se a discutir as potencialidade do blog como concorrente da imprensa escrita, sendo que também possui uma das armas mais fortes da rádio, a imediatez.

Mas, afinal, o que é um blog? O blog – ou web log - é um diário publicado na Internet. É uma lista de entradas organizada por ordem cronológica, com a entrada mais recente geralmente no topo. Dizer que é um diário não implica necessariamente que contenha um relato da vida privada de quem o escreve. É um pouco mais como o diário de bordo do capitão de um navio, que descreve todos os dias as aventuras e desventuras da navegação.

O blog é o diário de bordo de quem navega na Internet. Foi assim que começou, pelo menos, há apenas meia dúzia de anos. Alguém encontrava um site obscuro sobre filosofia asiática, e anotava no blog as suas impressões. Talvez pudessem vir a ser úteis a alguém que por aí andasse à deriva. Outras pessoas contavam o que acontecia no seu bairro. Alguns destes textos continham informação que não tinha sido publicada em nenhum órgão de informação tradicional – talvez não tivessem passado o filtro do editor, ou talvez nenhum jornalista tivesse sequer sabido que aquilo aconteceu. Alguma dessa informação poderia ser suficientemente interessante para ser chamada de notícia. Qualquer pessoa pode ter um blog na Internet. Existem várias empresas a oferecer espaço para a página, de graça. E qualquer um pode escrever notícias no seu blog. Viremos a ter uma população inteira de jornalistas? Estaremos perante uma nova forma de jornalismo?

Notícias alternativas
Os blogs publicam notícias, e blogs de especialistas na área da informática, economia ou física nuclear começam a ser consultados com regularidade como fontes de informação alternativas aos media tradicionais. Através do blog, começou a ser possível saber o que não tinha sido noticiado nos jornais, ou sabê-lo antes do jornal sair, com um nível de profundidade impossível na rádio. Nos Estados Unidos, um sindicato decide organizar uma greve. Dez minutos depois de o comentário ser publicado no blog, às três da manhã em Londres, um grupo de discussão on-line que incluía intervenientes portugueses, americanos e franceses elaborava cenários de evolução da situação e planeava soluções. Duas horas depois, a greve é cancelada. Mais algumas horas passam antes de os jornais publicarem a notícia – algumas horas tarde de mais para quem quisesse mudar o curso dos acontecimentos. A televisão, só à noite, se nessa altura ainda houver algo que valha a pena ser contado.

Através do blog, vislumbramos uma revolução dos media. Um jornalismo descentralizado, flexível, imediato, isento de pressões políticas e económicas, uma voz para cada cidadão num espaço público global, em toda a plenitude democrática que só as novas tecnologias podem oferecer. Bom demais para ser verdade?

Richard Smith, investigador e especialista em Comunicação da universidade Simon Fraser, no Canadá, mostra-se optimista, mas com reservas: “Claro que nem tudo o que aparece nos blogs pode ser considerado jornalismo, a menos que adoptemos um conceito muito diluído do que é o jornalismo. Dito isto, creio que é válido afirmar que o conteúdo de alguns pode ser sem dúvida descrito como jornalismo. Alguns blogs são até escritos por jornalistas profissionais, embora uma certa percentagem use pseudónimos, por uma variedade de razões”.

A questão é que nem tudo o que é notícia pode ser considerado jornalismo, e nem tudo o que um jornalista profissional escreve é jornalismo. Claro que o jornalismo tradicional tem limitações e problemas. Claro que o gate-keeping pode aproximar-se da censura, e que uma opinião de esquerda dificilmente será publicada num jornal de direita. No entanto, o facto de um jornalista profissional estar condicionado por regras deontológicas não deve ser considerado uma prisão, mas uma garantia de qualidade.

Poderemos desistir de todas as regras e ter ainda jornalismo? A liberdade de expressão é um dos pontos centrais da democracia, mas a liberdade completa de expressão individual levaria à anarquia, não à democracia. Escrever sob pseudónimo é uma garantia de liberdade total, mas poderá haver jornalismo sem que o escritor tome responsabilidade pelo que é dito? A existência de tribunais não garante que haja justiça, e sem dúvida que muitos culpados são absolvidos, e inocentes castigados em nome da lei – mas, ainda assim, geralmente considera-se que estes erros são um mal menor, porque a alternativa não é aceitável. A alternativa é confiar nos homens, em vez de confiar nas leis. Só a responsabilização, associada à possibilidade de punição legal, torna possível a democracia, e a liberdade do indivíduo num contexto social (a liberdade individual tem que estar limitada pelo respeito dos direitos dos outros).

Autoridade, conhecimento e responsabilidade

Oscar Wilde disse que não faz sentido termos uma arte cingida à obediência das regras da moral. Se o jornalismo fosse uma arte, faria sentido exigir uma liberdade absoluta para o jornalista a todo o custo. Mas a arte, se pode ser um componente do jornalismo, não será seguramente a sua essência. O jornalismo do blog é fundamentalmente um jornalismo de opinião. As opiniões podem ser jornalismo, mas apenas quando analisam factos de forma útil, ou os predizem com bases razoáveis de probabilidade. Uma liberdade total, uma total ausência de responsabilização, implica uma liberdade de ignorar os factos, e uma opinião expressa sem respeito pelos factos, ou até com respeito pelos factos mas sem a possibilidade de dar uma garantia desse respeito ao leitor, não é mais do que um rumor.

Quantos de nós é que têm o tempo e a vocação para investigar um rumor? Se um desconhecido me abordar na rua e me sugerir que tome um certo medicamento, porque isso melhoraria a minha saúde, ele não me está a fornecer qualquer informação, mesmo que isso seja verdade, enquanto não se identificar como médico. O argumento de autoridade funciona porque a autoridade está baseada não só num conhecimento de especialista mas também na responsabilidade. Acredito no médico não só porque ele sabe que medicamentos devem ser tomados, mas também porque o médico poderia sofrer consequências legais no caso de receitar um medicamento errado. Quando o autor de um blog escreve sob pseudónimo, perde a credibilidade ao prescindir da identidade.

O futuro do blog não é tão negro assim. O autor de um blog pode obter autoridade através da referência a fontes, que se forem links poderão ser verificadas imediatamente. Alguns destes links poderão ser fontes absolutamente fidedignas. Quem assina o blog pode usar a sua verdadeira identidade (embora isto só seja relevante se houver uma forma fácil de a comprovar).

Os blogs podem ser a única via para algumas verdades, se puderem evitar ser compilações de rumores. Embora eu prefira confiar em leis do que nos homens, um homem ou grupo de homens poderão provar que merecem essa confiança, mesmo sem leis que os limitem e controlem. Seja como for, o blog já encontrou a sua função, mesmo que se limitasse a ser uma fonte de rumores a usar por jornalistas, porque uma notícia começa com frequência num rumor.

Na opinião de Richard Smith, “alguns jornalistas irão procurar ideias nos blogs, e o estilo de escrita poderá influenciar o actual estilo jornalístico. Não creio que irão substituir os media tradicionais, mas creio que para alguns tipos de informação (e opinião), os leitores irão optar por um blog que conhecem e em que confiam. Tal como os vários media, ao surgirem, não substituíram os media anteriores, também os blogs irão ocupar o seu próprio espaço dentro do ambiente existente. Podemos ver a situação como uma ecologia mediática em que os blogs preenchem um nicho.”

É fácil cedermos à tentação de classificar, mas é ainda demasiado cedo para decidirmos o futuro do blog. Poderá, um dia, ser regulamentado. Talvez deva sê-lo, mas só até certo ponto. Um blog sem regras não é jornalismo, e um blog com as mesmas regras do jornalismo seria a tecnologia sem a filosofia, não já um blog em toda a sua arrogância intelectual, e até artística. Algo se teria perdido. Acredito que não seja preciso ter uma liberdade completa do indivíduo para se poder ter arte e jornalismo em simultâneo - creio que a democracia basta.
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Agradece-se a colaboração de Richard K. Smith, investigador e professor na área de Comunicação da Simon Fraser University, em Vancouver, Canadá

LINKS

O blog de Doc Searls (editor do Linux Journal), um dos mais famosos da Internet: http://doc.weblogs.com

Outro dos blogs mais visitados, o de David Gallagher (colaborador do New York Times)
http://www.lightningfield.com

Para obter espaço para um blog de graça, em alguns minutos: htpp://www.blogger.com
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sábado, junho 07, 2003
 
Fonte: Público - 02 de Junho 2003

Poucos Graus de Separação
Segunda-feira, 02 de Junho de 2003
P.F.

É difícil as empresas não apanharem o comboio dos "blogs". Está-se no início da tendência mas o interesse de alguns participantes na BlogTalk em colocar questões aos oradores que abordaram o assunto denunciou esse mesmo potencial.

Do lado da mesa, a primazia no assunto foi para Henry Copeland, presidente da Pressflex, empresa norte-americana que fornece sítios na Web a 90 órgãos de comunicação europeus e também criadora do Blogads, um serviço para "blogs" trocarem anúncios publicitários entre si. Embora salientando que se tratava de um quadro teórico, ele foi traçado como se estivesse a vender "blogs" às agências publicitárias: gráficos, tendências de crescimento, comparações, estímulos intelectuais.

As pessoas tendem a acreditar num produto recomendado por alguém conhecido, mais do que na publicidade num média. Como os "bloggers" se organizam em "grupos de pares", é fantástico para qualquer empresa ter uma recomendação de um desses pares.

É esse o desafio para os anunciantes - e uma ameaça para os média. Copeland deu o exemplo da Craiglist, que obtém 2 milhões de visitas no seu "blog", enquanto o "New York Times" consegue muitos mais - mas o que investe o jornal no seu sítio na Web comparado com outro, gerido por uma pessoa?

"É difícil os anunciantes entrarem" nos "blogs", é uma realidade diferente, reconhece Copeland, tanto mais que a maioria é um pequeno item num enorme supermercado e tem dificuldades em sobressair. Mas eles poderão facilitar a sua descoberta pelos publicitários. Há duas vias: paixão e ligação ("hubness").

No primeiro caso, está Andrew Sullivan, que pediu aos leitores para contribuírem financeiramente ou teria de fechar o seu "blog". Em duas semanas, 3339 leitores enviaram um total de 79.020 dólares. Outro exemplo é o Slashdot, onde qualquer menção a um sítio na Web remete para lá 10 mil visitas.

No caso das ligações, Copeland partiu do trabalho sobre os "seis graus de separação" que especifica, no essencial, que, entre qualquer humano X e outro Y, há um máximo de seis pessoas. Um exemplo conhecido destas ligações verifica-se com actores: por exemplo, o que liga o português Joaquim de Almeida a Kevin Bacon?

Almeida participou no filme "Nous sommes tous encore ici", com Aurore Clement, que, por sua vez, foi actriz em "Apocalypse Now" - onde contracenou com Colleen Camp, que participou em "Trapped" com Kevin Bacon (ver www.cs.virginia.edu/oracle/ ). Desta forma, bastam três graus de separação para juntar os dois. Algo semelhante se passa na blogosfera, pelas ligações entre "blogs", usando motores de busca ou indexadores.

Por outro lado, alguém que consegue ter 10 por cento do mercado hoje tende a mantê-los quando ele cresce. "É perverso mas é assim que os ricos enriquecem ainda mais", lembrou Copeland. Mas "não basta que A e B saibam algo, os outros também têm de conhecer" e isso passa pela coordenação de acções - tal como quando se acede a um "blog" porque outros "bloggers" costumam falar dele.

É esta conjugação entre disseminação de "blogs", a manutenção de liderança e o potencial crescimento que cativa os anunciantes publicitários, queimados pelas asneiras feitas no "on-line" nos últimos anos. Daí o interesse nas visualizações gráficas de ligações entre "blogs", como o BlogosphereMap (ver imagem), porque "permite mostrar algo aos anunciantes e ver onde vale a pena investir".

Esta tendência foi criticada por alguns elementos da audiência, salientando que já basta o "spam" no correio electrónico, quanto mais nos "blogs", nomeadamente nos comentários. "Mas o 'spam' é uma forma de alguém dizer que reconhece o valor desse 'blog'", retorquiu Copeland.

"O 'spam' existirá mas será eliminado, o criador do 'blog' pode fazê-lo, excepto se for interessante", explicou-nos pouco depois. E se é criada uma forma automática para enviar publicidade para os comentários dos "blogs"? "Alguém desenvolverá código para o eliminar ou impedir."
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